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Outros artigos do Prof. Bruno Massara Rocha

A VIRTUALIDADE ENQUANTO REALIDADE POSSÍVEL

Palavras-chave: tecnologia digital; virtual; realidade

Tem sido muito comum a utilização do termo virtual associado à arquitetura e urbanismo em função do desenvolvimento e aplicação das tecnologias digitais nos campos da informática aplicada e computação gráfica. O que tem sido comumente considerado como virtual pode ser definido como uma reprodução fiel de determinada edificação, lugar ou objeto, cujas características são literalmente traduzidas para um modelo digital que simula o funcionamento e os aspectos morfológicos do elemento original. Utilizado desta maneira o termo virtual assume um sentido de algo ilusório, uma ausência de existência ou um antônimo do real. No entanto, segundo as considerações de Lévy o virtual nos remete a uma outra forma de interpretação que sugere uma nova categoria de existência. A virtualização implicaria em

"uma mutação de identidade, um deslocamento do centro de gravidade ontológico do objeto, uma elevação à potência da entidade considerada" [1].

Segundo o filósofo, o virtual não se opõe ao real, consiste numa “elevação à potência” de um objeto ou situação a partir de onde poderão ser feitas diversas atualizações. O processo de atualização seria uma outra insurgência da situação virtualizada ou potencializada, um outro instante em que ela se realiza mas sempre a partir da interferência de um fator externo a ela, que estabelece critérios ou regras de aparição a partir de uma intenção prévia. Nesta acepção do termo podemos afirmar que o computador virtualiza possíveis representações do espaço em suas linhas de programação e o usuário as realiza no momento em que coloca suas intenções diante da interface interativa. A interface é a mediadora entre o usuário e o conteúdo da apresentação que se encontra potencializado pelo computador. Ela é o espaço de ocorrência de uma determinada combinação de elementos que irão ser atualizados pelo usuário de modo a compor o corpo da apresentação arquitetônica digital.

O conceito de virtual tem sido também empregado para se referir às novas formas de relação mediada pelas tecnologias digitais que eliminam a necessidade de proximidade física entre os envolvidos como por exemplo ocorre com os fluxos de capital entre os centros de comando e suas unidades produtivas. São comumente utilizadas afirmações como “fluxos virtuais de capital” ou mesmo “fluxos virtuais de informações” o que é, na verdade, um desacerto conceitual uma vez que, se eles acontecem, são reais e não virtuais. Virtuais seriam as múltiplas possibilidades de percurso destes fluxos em função das combinações também virtuais de organização acionária no controle das empresas. Isso significa dizer que não é devido ao fato de que as transações, negociações e fluxos acontecem num espaço imaterial que elas podem ser definidas como operações virtuais. Elas são tão reais que, como vemos constantemente nos noticiários, provocam grandes impactos no território urbano em termos de infraestrutura, logística, disposição de equipamentos urbanos, concentrações populacionais, relações entre mercados, etc.

 





Tanto Virilio quanto Lévy consideram que a virtualização destas atividades, como os fenômenos comerciais e industriais, instauraram uma descontinuidade espaço-temporal na qual torna-se perceptível uma “unidade de lugar sem unidade de tempo” (VIRILIO)[2]. Sua virtualização consiste numa amplificação de suas possibilidades de realização e em muito se relaciona com a aceleração observada por Virilio ao se deter na análise dos grandes centros urbanos atuais. A ampliação das velocidades de troca de informações possibilita a descentralização das grandes empresas em centros de controle, centros produtivos, centros de prestação de serviços especializados cada um deles com localizações geográficas específicas. Apesar de espacialmente descontínua, a empresa possui um sincronismo entre as suas atividades proporcionado pelas múltiplas possibilidades, virtuais, de agenciamento oferecida pelas novas tecnologias.

Não podemos afirmar que trata-se de um evento totalmente novo em nossa sociedade já que esta descontinuidade espaço-temporal, mesmo que em escalas menores do que as de hoje, ocorrem a cada momento em que um novo sistema de comunicação e transporte é inventado. Entretanto a dimensão que a descontinuidade entre ação e proximidade alcança atualmente é conseqüência da amplificação exponencial das velocidades com que estas ações se realizam. O volume e a intensidade de informações que são hoje possíveis de serem transportadas permitem, por exempo, teleações em tempo real como operações de compra e venda de produtos, telepresenças como no caso de video-conferências, prestações de serviço feitas através da internet como a manutenção de redes de computador entre outras atividades que ampliam esta descontinuidade entre ação e lugar.

O virtual se relaciona com o conceito de possibilidade, com a projeção de cenários futuros advindos das conexões entre fatores reais. A crescente reconfiguração dos meios de conexão introduz novas possibilidades de construção da realidade concreta e, no caso da arquitetura, do espaço urbano. Portanto, é necessário admitir o virtual como realidade possível e não como realidade ficcional. A compreensão e a visualização dos fatores condicionantes da formação do território pode se entendida como sua representação virtual, porque tornam visíveis as relações e apontam para uma realidade possível. 

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NOTAS

[1] LEVY, Pierre.O que é o virtual?. São Paulo: Ed. 34, 1996, p. 17-18.

[2] VIRILIO, Paul. O espaço crítico:e as perspectivas do tempo real. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1999, p. 11.